Há poucos dias recebeu-se com surpresa a notícia que Rui Rio, após a pouca oposição feita ao governo durante o período de confinamento/pandemia, estaria disposto a “negociar” com André Ventura, a jusante da sua moderação. Surpresa? Nenhuma.
Parece evidente que, seria expectável, com o crescimento dos acordos entre o Governo e partidos de esquerda, a oposição da mão contrária teria também, de alguma forma, reagir. As regras do jogo têm de ser igualmente válidas para os dois lados. Parece-me lógico que, quanto mais influência um extremo detém (qualquer que seja o seu lado), terá que existir uma contrapartida do lado contrário.
O que me preocupa é estarmos a constatar cada vez mais a perda da individualidade dos partidos, característica que considero essencial numa democracia. Com a premente pressão para equilibrar as forças políticas e ganhar “poder de mercado”, os partidos maioritários (Bloco Central) estão progressivamente a aliar-se com os seus colegas de extremo. Assim, passamos a ter um Partido Socialista sobre a influência de um partido claramente menos centrista, o Bloco de Esquerda e, segundo os recentes avanços, um Partido Social Democrata possivelmente sobre a influência da extrema direita num futuro próximo. Esta tendência não parece estar a desvanecer. Certamente que estes entendimentos e acordos são necessários para a existência de uma maioria absoluta, não se coloca isso em causa. Também não está a ser discutida a validade do que o que cada partido defende, cujo espectro de ideais acaba por ser diminuído ou comprimido a um duo de conceitos aparentemente ocos de uma interpretação fora da literal. Falo de esquerda e direita. Apenas constato, com alguma apreensão, a crescente influência da oposição menos moderada no debate político atual e nos partidos considerados mais moderados.
Para além disso, considero que esta situação possa criar, pelo menos para mim, um dilema aquando da ida às urnas. Pois, é provável que uma pessoa que hipoteticamente vota no PSD, não queira que o seu voto indiretamente conceda mais influência ao Chega (isto se o tal acordo sempre se concretizar). Este raciocínio reflete-se também considerando o PS e o BE (ou o PCP). E vice-versa. Ou seja, os apoiantes de partidos mais extremados poderão não querer ver o seu voto associado aos partidos mais centrais no espectro político. Assim sendo, e face ao exposto, não creio que Rui Rio abdique dos valores essenciais que caracterizam o seu partido, ou conceda algum tipo de influência notória ao partido de André Ventura. Interpreto esta intenção de um possível entendimento/acordo como uma decisão inteiramente estratégica para incrementar a força da oposição face a um governo cada vez mais aliado à esquerda.
Adicionalmente, vejo-me também algo apoquentada com o futuro (não promissor até agora) do debate político, os jovens. Excluindo a grande maioria de eleitores jovens que abdica do direito de voto (tema importante a ser discutido), a minoria remanescente está cada vez mais a alocar-se a partidos políticos menos moderados. Jovens estes que, supostamente, já têm experiência de vida ou conhecimento suficiente para ter um entendimento claro da história, e apontar as razões pelas quais as ideologias que defendem, na prática, são pouco ou nada exequíveis do ponto de vista ético e/ou moral (pelo menos segundo o meu ponto de vista).
A política aparenta-se cega a apenas dois caminhos. Esquerda e direita. Que tal seguir em frente?
Imagem: Expresso